Abril de 2008, Serpa, antigo Apeadeiro do Guadiana. Noite cerrada. Já passa da meia noite. É dia 24. Junto dos carris, perto da antiga ponte ferroviária, agora desactivada,um clarão de luz intensa rasga a escuridão da noite. Quatro vultos debruçam-se sobre o que parece ser um lençol branco colocado por baixo duma lâmpada suspensa a mais de um metro de altura.
Atraídos pela luz muitos insectos esvoaçam à volta da lâmpada até que poisam inquietos no lençol.
“Um dos vultos diz: Isso que estás a dizer deve ser uma grande treta. Outro vulto acrescenta: Vê-se mesmo que estás a inventar esse nome. Um terceiro também intervém: Oh Eduardo, mas tu queres convencer-nos que sabes estes nomes todos de cor!!? Tudo dito no meio de gargalhadas e de grande atenção para uma pequena borboleta nocturna que o visado tem entre os dedos. Com um sorriso complacente afirmou: Já vos disse: Esta é a Cleonymia pectinicornis e este é o primeiro registo da sua presença em Portugal. Não tenho aqui o livro mas amanhã vou confirmar.”
Toda aquela conversa era para o fazer afinar. Todos sabiam, e sabem, que o Eduardo Marabuto, um jovem biólogo de 23 anos, é um dos nossos grandes especialistas em borboletas, sejam elas nocturnas ou diurnas. A sua capacidade para identificar borboletas, especialmente as nocturnas, cujo numero de espécies ultrapassa o milhar, é verdadeiramente notável. Não fosse a presença do Eduardo e eu,o Dinis Cortes e o Ivo Rodrigues nunca teríamos distinguido uma raridade entre as dezenas de borboletas pousadas no lençol.
I – Cleonymia pectinicornis
Nesse mesmo dia, ainda de manhã, fui com o Eduardo procurar outra raridade, esta diurna, nos arredores de Beja. Apesar dos nossos esforços, andamos mais de uma hora em trabalho de pesquisa, só vimos um exemplar da Melitaea aetherie que, felizmente, conseguimos fotografar. O bicho é mesmo raro.
II – Melitaea aetherie
Da parte da tarde, depois de novo encontro com o Ivo Rodrigues que nos proporcionou fotografar a Orchis laxiflora (Orquidea que em Portugal está classificada como RR, muito rara ), fomos os três ao encontro do Dinis Cortes para ver e, se possível, fotografar a Pseudophilotes abencerragus. Já imaginaram o que é fotografar num terreno pedregoso, com uma brisa leve mas permanente, um insecto irrequieto com uma envergadura de 18-22 mm (Maravalhas, 2003) e que voa em ziguezague junto ao chão e às plantas!? A situação ainda se complica mais quando se tem por hábito usar o tripé. Mas o resultado é compensador. A Dinis Cortes e ao Ivo Rodrigues os meus agradecimentos pela amizade e entusiasmo com que nos receberam e acompanharam.
III – Pseudophilotes abencerragus
Num só dia fotografar estas três raridades não é obra do acaso. É obra de Eduardo Marabuto, um jovem com uma grande paixão pelas borboletas e cuja autoridade nesta matéria se tem vindo a impor entre os nossos especialistas de borboletas. E eles são ainda muito poucos. João Pedro Cardoso, Eduardo Marabuto, Ernestino Maravalhas, Luís Mendes, Bivar de Sousa, Patrícia Garcia Pereira (só diurnas) e Pedro Pires. Estes são os que conheço com trabalhos publicados. Marabuto está agora a preparar a sua tese de Mestrado que, como não podia deixar de ser, incide sobre uma borboleta, a Euchloe tagis. A distribuição em Portugal desta borboleta estava até há pouco tempo confinada à Serra da Arrábida e com um registo antigo na zona de Leiria. A tese de Eduardo Marabuto vai concerteza alterar esta situação. As suas notícias e fotos podem ser vistas em
http://eduardomarabutonature.blogspot.com.
IV – Euchloe tagis
Para quem queira conhecer as nossas borboletas nocturnas sugiro uma visita ao sítio que mantem em parceria com Pedro Pires no endereço http://www.lusoborboletas.org