Na passada Primavera visitei a Serra dos Candeeiros. Já não passava por lá há quatro ou cinco anos.
Entrei pela povoação Chãos e quando cheguei ao alto deparei-me com a velha pedreira que ali esventra uma zona nobre da Serra e cuja actividade liberta poeiras que cobrem toda a flora circundante. Mas esta era uma paisagem empoeirada já conhecida. O que me surpreendeu foi a presença de uma turbina eólica.
Pedreira e turbina eólica
Esta presença foi apenas o começo de um triste espectáculo.
Eu nem sou contra as chamadas “energias limpas”, pelo contrário, mas não estou de acordo que com três dezenas e meia de turbinas eólicas se degrade e elimine toda a paisagem natural de uma serra pertencente a um Parque que se diz “Natural”.
Tenho comigo um folheto em inglês, emitido pelo ex-ICN (actual ICNB), onde se escreveu: ”The Natural Park of the Serras de Aires e Candeeiros is a Protected Area…”.
É caso para perguntar:área protegida de quê ou contra quê?
Esta serra desenvolve-se em patamares que de SSW para NNE vão subindo de cotas atingem, um patamar de cotas máximas e voltam a descer. A localização menos agressiva para a paisagem seria a de escolher um ou dois patamares e nele(s) concentrar as turbinas em linhas perpendiculares á linha de crista da serra. Mas não, a solução escolhida foi a de colocar uma fiada de turbinas de ambos os lados da estrada que segue toda a linha de crista. Além disso colocou-se o Edifício de Comando/Subestação no topo Sul do parque eólico o que certamente veio aumentar o trânsito de viaturas a circular pelo alto da serra.
A Gralha-de bico-vermelho (Pyrrhocorax pyrrhocorax) e outros seres emblemáticos da região devem andar encantados com o vaivém, de turbina em turbina, dos técnicos do parque eólico.
Turbinas seguindo a linha de crista
Para amenizar a minha tristeza consegui comprovar a presença na parte central da serra,a meio caminho entre Chãos e Vale de Ventos,onde a vegetação não atinge os 50 cm de altura,da rara e fugidia borboleta Euchloe tagis, a Branca-portuguesa. O meu amigo Eduardo Marabuto na sua Tese de Mestrado em Biologia da Conservação já tinha referido a sua presença no Maciço Calcáreo Estremenho em zonas de matagal nas proximidades de Porto de Mós e de Minde. Agora podemos dizer que ela também aparece nos terrenos abertos da área central da Serra dos Candeeiros.
Branca-portuguesa
A imagem é de má qualidade, mas serve para identificar a borboleta. O seu voo nervoso que reconheci e me levou a segui-la e a paragem forçada pelo assédio de um macho foram a chave para eu ver no terreno aquelas asas arredondadas tão características da espécie.
Um pouco mais tarde e um pouco mais a NNE, na zona do Serro Ventoso tive o prazer de ver pousada, em plena luz do dia,a borboleta nocturna Macrothylacia diagrama*, pertencente à família Lasiocampidae.
Macrothylacia diagrama
Macrothylacia diagrama
Termino deixando uma sugestão. Para que a designação dos Parques continue a incluir a característica de “Natural” e não andemos a enganar-nos a nós próprios e a quem nos visita, é conveniente e apropriado que os novos folhetos do ICNB ostentem em letras garrafais o seguinte aviso:
“Em Portugal tudo o que se constrói e destrói para cima e para baixo do solo é considerado “Património Natural”.
Para identificar a borboleta nocturna recorri às imagens do sítio:
http://www.lusoborboletas.org